Há momentos que as palavras se perdem no ar; e quando o ciúme se transforma em conflito, o amor pede escuta, mas só encontra ruído.
A palavra que poderia expressar o medo, a dúvida ou o desejo é substituída por acusações, silêncios e afastamentos. O que eram emoções legítimas torna-se uma tentativa de controle; uma defesa contra a vulnerabilidade.
É aí que o ciúme revela sua face mais dolorosa: não como prova de amor, mas como sintoma da insegurança.
A ausência da palavra, ou a palavra mal dita, abre espaço para o conflito.
O que não é dito ganha vida própria e o que é dito, muitas vezes fere, a quem ouve e a quem fala.
Quando conseguimos nomear o que sentimos, abrimos espaço para compreender o medo, reconhecer o desejo e, sobretudo, reorganizar e libertar o que habita dentro de nós e muitas vezes nem conhecemos.
A psicanálise nos convida a olhar para além do conflito e da pessoa ou situação que o desperta, e escutar o que o conflito diz sobre nós. O que há em mim que teme ser trocado, esquecido ou insuficiente? Que ferida antiga se reabre quando sinto que posso perder?
O trabalho analítico consiste em transformar o conflito em palavra. Falar do que dói é permitir que o sofrimento encontre forma e sentido. Assim, o que antes era tensão se torna possibilidade de compreensão e um caminho para o autoconhecimento.
Na perspectiva psicanalítica, o ciúme revela uma fissura na experiência de si. Não é apenas um afeto voltado ao outro, mas um espelho da relação que temos conosco, com nossa autoestima, nossa história e as faltas que nos constituem. Ele denuncia o medo de não ser suficiente, de não ocupar o lugar que imaginamos ter no desejo do outro.
Essa ferida narcísica, a de não ser tudo para alguém, é uma das mais difíceis de aceitar.
Falar do ciúme não o elimina, mas o humaniza. Permite reconhecer que, por trás dele, há amor, mas também medo, carência e vulnerabilidade.
Em vez de lutar contra o outro, a análise nos convida a voltar o olhar para dentro e compreender o que, em nós, se sente ameaçado.
Talvez o verdadeiro trabalho não seja eliminar o ciúme, mas dar-lhe voz, para que o conflito, enfim, possa ceder lugar à palavra.